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Informe-se! Essa seção é destinada para que, primeiramente, seja possível passar ao leitor uma visão geral e cronológica sobre o problema atual que a USP enfrenta.
Após a leitura dessa seção, recomenda-se que o leitor se intere na próxima, Questione-se!

Atente-se a essa seção. Ela os dará base inicial para compreender melhor nossas razões.

USP e a PM: uma relação histórica

“SOBRE A OCUPAÇÃO PELA PM DA USP:

Como ex-coordenador do CEUPES, Centro Acadêmico de Ciências Sociais, ex-diretor do DCE livre Alexandre Vanucchi Leme, e ex-coordenador da Associação de Pós-Graduandos da USP, aproveito o espaço para recobrar os anos vividos na Universidade de São Paulo e que, ao que parece, foram esquecidos por muitos.

No final do período ditatorial, ainda sob o governo de um presidente ilegítimo, estudantes, professores e funcionários da USP lutavam, conjuntamente, pela autonomia universitária, o que pressupunha liberdade de pensamento, de produção e também de administração da Instituição. Após décadas de controle policial sobre a Universidade, que incluiu o expurgo de seus mais ilustres quadros intelectuais, como Florestan Fernandes e tantos outros, que chegaram a ser presos dentro de sala de aula, me soa reacionária e anacrônica a postura do atual Reitor da Universidade de São Paulo que, como os últimos dirigentes da USP, não foi legitimamente escolhido pela comunidade, mas imposto pelo governador do estado de São Paulo, já que não foi o primeiro da lista tríplice.
No início do governo Sarney, sob a perspectiva de reconstitucionalização democrática do país, a USP, a UNICAMP e a UNESP se tornaram centro de um franco debate acerca da liberdade científica, de pensamento e de expressão. Propunha-se a autonomia universitária como único remédio contra os abusos policiais do Estado e em favor da liberdade de pensamento. Se, por um lado, indicava-se, no âmbito do Projeto GERES (Grupo Executivo de Reforma do Ensino Superior), liderado à época por José Goldemberg, Simon Schwartzman e Eunice Ribeiro Duhan, um modelo produtivista e tendencialmente privatista a ser implementado na Universidade, por outro existia uma franca oposição das comunidades universitárias, que exigiam autonomia, ampliação de vagas, aumento de professores, mais assistência estudantil e, principalmente, liberdade.
Com a subida do PMDB ao poder, em 1986, Quércia fechou um acordo com as comunidades universitárias das três Universidades paulistas, no sentido de garantir um percentual fixo do ICMS para o financiamento das Instituições e autonomia administrativo-financeira, em troca da garantia de manutenção de conselhos universitários com forte peso governista e das listas sêxtuplas e tríplices nos processos eleitorais de dirigentes, mantendo sob a batuta do governo a indicação do reitor. A eleição em dois turnos, pelo colegiado ampliado, e, depois, pelos órgãos centrais, presumia a eterna perpetuação conservadora da estrutura de poder na Universidade, como de fato ocorreu.
Goldemberg se tornaria Reitor, e súper Ministro (chegou a acumular 3 ministérios durante o governo Collor) e Eunice e Simon, seriam os mais fiéis escudeiros da política estadual e nacional de privatizações do ensino superior durante os anos do PSDB no poder.
A política de privatizações da produção das Universidades públicas se ampliou. As Fundações de direito privado, que captavam recursos da iniciativa privada e os aplicavam de acordo com os interesses particulares das empresas financiadoras, passaram a conduzir boa parcela da política acadêmica da USP. A FIPE, a FIA, a Fundação USP, a Zerbini, entre muitas outras, passaram a se responsabilizar por parte dos recursos aplicados em pesquisa e até se responsabilizaram pela complementação salarial para alguns professores e funcionários das áreas de ponta.
Paralelamente, foi iniciada uma profunda reforma administrativa na Universidade, que incluía a terceirização de serviços de baixa qualificação, como limpeza e segurança. A autonomia universitária presumia que a USP se responsabilizasse pela segurança interna de seus campi, assim, constituiu a Guarda Universitária, que fazia rondas, resguardava o patrimônio e inibia delitos e ilícitos. A criação da Guarda Universitária, entretanto, não foi suficiente para evitar que a PM entrasse nos campi e realizasse operações sem qualquer autorização do magnífico Reitor, desconsiderando a autonomia, conquistada a duras penas na constituinte estadual.
Após longos anos de luta incessante, os estudantes se fortaleceram e ficaram à frente do movimento contra a PM no Campus Butantã. Em todos os muros da cidade universitária se viam cartazes contra a PM no Campus. É bom lembrar que a Academia de Polícia está localizada na entrada da Cidade Universitária.
A luta se intensificou em conformidade com a calamidade econômica do governo Sarney. Na Unicamp os estudantes viraram um camburão da PM e o incendiaram. Quando os caminhões foram retirar os destroços do automóvel, os alunos impediram a ação, queriam deixar os destroços expostos para que as futuras gerações pudessem sempre se lembrar da luta contra a PM no Campus.
Na USP, finalmente, foi consolidada a posição contrária às operações da PM no Campus sem autorização expressa do Reitor. A Autonomia se fortalecia.
Não obstante, as terceirizações e a crise econômica levaram a uma contínua redução proporcional dos contingentes da Guarda Universitária. Guarda esta, desarmada, usada como elemento de dissuasão, sob uma política de segurança preventiva e não repressiva.
A ampliação da USP e a não ampliação da Guarda, ao lado do seu sucateamento técnico, levaram a uma escalada cada vez maior dos delitos dentro da Campus. A Reitoria não estava disposta a fazer empenhos de recursos cada vez maiores para garantir segurança, assim, permitiu a escalada da insegurança, o que abriu caminho para, a partir do recente caso de assassinato, retomar a relação entre a USP e a PM. Não tardou, obviamente, para que essa nova política, repressiva e não mais preventiva, criasse constrangimentos e produzisse violência.
O atual quadro da USP demonstra um erro profundo na condução da política de segurança interna e, pior, representa um retrocesso perigoso no tangente à restrição da autonomia universitária e da liberdade.
Lutar contra a PM no Campus não significa defender o ilícito, mas a liberdade e a não violência. Significa também exigir uma nova política interna de segurança que retome a perspectiva preventiva que, durante anos, foi mais eficaz que essa recente e anacrônica política repressiva. A PM certamente tem muito mais coisas a fazer fora do Campus, a violência na cidade de São Paulo atingiu níveis inaceitáveis. E a gloriosa Polícia Militar matou, segundo a imprensa de ontem, em cinco anos, mais pessoas que as polícias de todos os estados norte-americanos juntos. Esse, pelo visto, não é o caminho para uma sociedade mais justa, mais livre e com menos violência.
Todo o apoio aos estudantes. Quem tem memória não pode deixar de lembrar as décadas de luta pela liberdade e pela autonomia.
José Henrique Artigas de Godoy (doutor em ciência política pela USP e professor de Ciência Política do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba)”

Fonte: http://www.twitlonger.com/show/e1ihbm

Pessoas que apoiam mobilização dos estudantes

Marcelo Rubens Paiva

Michel Lowy

Raquel Rolnik

Pesquisadores da USP

USP: Uma visão geral

“Cinco da manhã. Você mora no CRUSP, mas não é afiliado a partido nenhum. Sempre foi apenas estudar, diz que se sente orgulhoso pela coroação do seu próprio esforço em conseguir passar na USP, e por isso mesmo sempre foi contra qualquer paralização – a Universidade é para estudar, não é para discutir política. Você estuda Literatura, então te interessa discutir o texto crítico que fala da obra literária que fala de política. Essa é sua carreira. Então começa a respirar mal, dormindo, porque tem gás lacrimogênio entrando pela sua janela. Tenta sair, mas tem luz de helicoptero na sua cara. Ouve bala de borracha de madrugada, e criança chorando, vê de relance cavalos e fuzis de verdade, gente algemada, gente gritando. Chega mais perto no meio da fumaça, para ver o que é. Sente a força nas costas, cai no chão. É algemado. Entenderam tudo errado. Você não queria ajudar ninguém…”

-Yuri Bossonaro

Esse artigo tem como objetivo lançar uma luz sobre os eventos lamentáveis do dia 08/11, ultima terça, quando a ocupação da reitoria na USP se tornou uma zona de guerra com mais de 400 policiais da tropa de choque, 3 helicópteros, policia montada, fuzis, gás lacrimogêneo e bala de borracha. 72 estudantes e funcionários da USP foram detidos. Dezenas de outros, como o coitado do texto acima, apanharam por estar no lugar errado na hora errada.

A despeito de minha raiva instantânea por tudo o que aconteceu, o pior veio depois, ao me deparar com a hedionda complacência e quase admiração com que amigos, familiares e tantos outros aplaudiram as ações da PM, como se estivéssemos falando da ocupação de um morro tomado por traficantes e não da invasão de uma reitoria repleta de alunos, estudantes…

Talvez isso se deva ao fato de que grande parte dessas pessoas não tenha a menor idéia de quem seja João Grandino Rodas, o reitor da USP e responsável pelo “massacre” da ultima terça, e também não tenha a menor idéia do que os alunos realmente reivindicavam. Prefiro tentar manter algum otimismo ou esperança na minha espécie.

Decidi perfurar o “lobby” da grande midia uma vez mais e fornecer algumas informações. O que cada um fará com elas, ou se elas serão capazes de mudar a cabeça de alguém, ja nao posso dizer. Só não posso me calar.

Antes de falar sobre o ocorrido da ultima terça, acho interessante um breve esclarecimento sobre os 3 principais elementos da tragédia: Os estudantes da FFLCH, João Grandino Rodas e a Policia Militar Brasileira.

Sobre os estudantes:

Segundo ranking internacional feito pela Top Universities, nove cursos da USP figuram entre os 200 melhores do mundo. Dentre esses, seis são da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas: Filosofia, Sociologia, História, Lingüística, Ciências Políticas e Geografia.

http://www.topuniversities.com/

Posto que esse índice mede o resultado do aprendizado do aluno, é interessante citá-lo para mostrar como aqueles barbudos subversivos que nossa mídia marrom tem pintado como um “bando de baderneiros sem causa” são na verdade as maiores mentes de nosso país, pelo menos sob o aspecto acadêmico.

Pode-se alegar que os responsáveis pela ocupação na reitoria não representam a vontade de todos os alunos da FFLCH, isso é fato. Mas se existem divergências quanto aos meios adotados pelos ocupantes e os demais alunos, o mesmo não se aplica aos fins. Que fins são esses? Voltaremos nisso em breve.

Sobre João Grandino Rodas:

Reitor da USP, colocado lá por José Serra em 2009, Grandino Rodas participa do corpo docente da universidade a muito mais tempo, possuindo um histórico bastante questionável de relacionamento com militares durante o período da ditadura. Possui um processo investigativo de desvio/ uso indevido de milhões de verba publica na universidade.

Rodas também está sendo investigado pelo Ministério Público de São Paulo por corrupção pelo envolvimento em escândalos como nomeação a cargos públicos sem concurso (inclusive do filho de Suely Vilela, reitora anterior a Rodas), criação de cargos de Pró-Reitor Adjunto sem previsão orçamentária e autorização legal, e outros.

É considerado o reitor mais ausente da história da universidade, jamais se colocando a disposição tanto dos alunos quanto do próprio corpo docente, sendo inclusive o primeiro reitor da história a ser considerado “persona non grata” pela Congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em represália a constantes ataques contra seu atual diretor.

Desde muito antes dos recentes episódios que colocaram em cheque a segurança da universidade, como o assassinato do aluno no estacionamento, já possui um histórico extremamente próximo com a Policia Militar. Em 22 de agosto de 2007, na época diretor da Faculdade de Direito, foi responsável pela entrada da tropa de choque na Faculdade, expulsando manifestantes da UNE e do MST, estudantes e membros do diretório acadêmico que haviam ocupado o prédio como parte das manifestações da Jornada da Defesa da Educação.

Em janeiro de 2011 foi responsável pela demissão em massa de 270 funcionários, por corte de verbas – a despeito dos imensos desvios e má aplicação do orçamento. Esse fato e diversas outras denuncias lhe renderam um convite para prestar esclarecimentos na Assembléia Legislativa de São Paulo (24 de março de 2011), mas ele não compareceu. Ele também não compareceu a dezenas de outras reivindicações e assembléias convocadas pelos alunos e professores ao longo de seu mandato. O que se fala é que é mais eficiente reclamar para Deus do que para João Grandino Rodas, no que concerne qualquer problema, duvida ou questionamento a respeito do que se passa na USP.

Sobre a Polícia Militar

Considerada uma das policias mais violentas do mundo, é um órgão que durante as décadas de ditadura foi usado como maquina de repressão do estado sobre a população. Foi NO MINIMO indiretamente responsável ou NO MINIMO complascente com o desaparecimento e assassinato de pelo menos 475 pessoas, segundo o livro “Direito a memória e à verdade”, publicado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos na ultima década.

Durante o período da ditadura a Policia Militar e a USP tiveram um relacionamento particularmente tenso, já que os principais movimentos de combate à ditadura no Brasil nasceram na universidade. Uma parcela considerável de nossos desaparecidos políticos daquele período eram alunos ou professores.

É uma policia subordinada aos governos dos estados e não às prefeituras, um modelo bastante raro no mundo. É apenas uma das muitas alternativas para assegurar a segurança pública, como a Policia Civil ou a Guarda Civil da USP, que deixou de receber treinamento e investimento por decisão do próprio Grandino.

Protagonizaram diversos eventos recentes de abuso de violência e repressão a artistas de rua, passeatas pacíficas ou movimentos como o Acampa Sampa.

O então delegado da Policia Militar (e hoje deputado estadual) Hélio Luz deu um chocante depoimento no documentário “Noticias de uma Guerra Particular” onde ele é bem categórico em dizer que “a polícia faz o papel de ‘proteção da elite’ e só pode usar a repressão para controlar dois milhões de pessoas nas favelas”. Ele admite que a polícia é uma instituição corrupta e afirma que “nós garantimos uma sociedade injusta”.

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Apresentados os personagens da tragédia, vamos aos fatos.

A despeito da crença popular de que o fato que desencadeou na invasão da reitoria e subseqüente violência da ultima terça tenha sido a prisão de 3 estudantes por estar fumando maconha no campus, os problemas do movimento estudantil que resultaram na ocupação da reitoria datam de muito antes.

A USP carece de planejamento urbanístico que favoreça a segurança, carece de iluminação apropriada e desde que Grandino Rodas assumiu a Guarda Universitária – real responsável pela segurança da autarquia (significa pela constituição que possui direito à autonomia administrativa) que é a USP – tem sofrido constantes cortes orçamentários, cortes em treinamento, equipamento, etc.

Isso já é pauta de discussão entre os diversos membros do movimento estudantil faz anos. Grandino Rodas não apenas ignorou durante anos os apelos do movimento, como adotou algumas outras medidas “excelentes” para a segurança da faculdade, como proibir a circulação de não-alunos nas dependências da Universidade.

Obviamente essa proibição vale apenas para as pessoas que como eu ou você, usam a portaria da USP, mas não para os trombadinhas ou traficantes que pulam os muros ou se embrenham pelas matas que cercam o campus. A USP já era um local ermo, se tornou um lugar ainda mais vazio. Sem iluminação e sem investimento algum em segurança, se tornou realmente terra de ninguém.

O que poucos enxergam é que isso foi deliberadamente provocado por Rodas ao longo de anos, sob constantes protestos e reclamações do corpo estudantil, para criar uma situação que JUSTIFICASSE a presença da PM na universidade.

As reivindicações dos alunos que invadiram a reitoria e foram arrancados de lá na porrada essa semana não eram”poder fumar maconha no campus”. O que eles queriam era o que já estavam pedindo a anos: Investimento real na segurança da Universidade, mas não abrindo as portas para a PM e fechando para a população (o que Rodas fez).

Grande parte do movimento estudantil da USP era contrário à ocupação do prédio da reitoria, mas são TOTALMENTE solidários às reivindicações listadas acima. Prova disso é a adesão de mais de 3000 alunos na assembléia realizada no dia 08/11, onde se decidiu pela greve.

Todas as decisões de Rodas nos últimos anos confluem para um único fim: Coibir a autonomia administrativa da universidade. Implodir sua estrutura de forma a justificar uma presença cada vez mais constante do estado, um movimento para a privatização das universidades e sua subseqüente subordinação ao segundo setor.

A palavra “Democracia” é derivada do grego “demo” (povo) e “cracia” (poder ou governo). Em um mundo onde nossa “democracia” tem se tornado uma ditadura subliminar, em que o estado se coloca sobre o povo e as empresas e corporações se colocam sobre o estado, a USP (berço intelectual, historicamente responsável pelo nascimento da maioria das revoluções que nosso país conheceu) possuir autonomia administrativa é uma imensa ameaça e um incomodo a ser extirpado.

E usando os bons e velhos artifícios de MEDO para convencer a população de que é preferível abrir mão da própria liberdade para ter segurança (11/09 e o ato patriótico nos EUA, só pra dar um exemplo bem recente) os grandes veículos de mídia, subordinados ao estado e às grandes empresas, estão conseguindo virar a opinião pública contra aqueles que lutam pela nossa liberdade.

Trecho retirado do texto “USP: Um desabafo”
fonte: http://temalguemaifora.wordpress.com/2011/11/10/usp-um-desabafo/
autor: igorius2011