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USP, universitários não querem volta aos tempos da ditadura

Por Wálter Maierovitch

–1.Os universitários da Universidade de São Paulo continuam a se mobilizar e muitos insistem no fim do Convênio com a Polícia Militar e a volta de um corpo próprio de funcionários para manter a segurança no campus.

–2. Como no tempo das ditaduras. Só para lembrar.

No dia 27 de outubro, a Polícia Militar, no campus da Universidade de São Paulo, desnudou a política de segurança pública do governador Geraldo Alckmin. Uma política de matriz filo-fascista conhecida desde o chamado massacre da Castelinho. Embora violenta, tal política foi desmoralizada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC), que se espalha e difunde o medo, sem ser contrastado com eficácia, pela periferia da capital paulista.

Enquanto o Rio de Janeiro, depois da chegada de José Mariano Beltrame à secretaria e sua decisão de pôr fim ao populismo bélico do governador Sérgio Cabral, investe na pacificação, o governador de São Paulo, ainda que sem Saulo de Castro a papaguear máximas malufistas na pasta da Segurança Pública, insiste na militarizada, direitista e populista linha conhecida por Lei&Ordem e as derivantes Tolerância Zero e War on Drugs (Guerra às Drogas).

Nelas sucumbiram Felipe Calderón, presidente mexicano, e George W. Bush, que perseguia com a polícia federal usuários terapêuticos de maconha e bateu à porta da Corte Suprema de Justiça para postular a declaração de inconstitucionalidade de leis estaduais que permitiam aos doentes o uso de maconha para finalidade terapêutica, por indicação médica. E não deve ser esquecido Rudolph Giuliani, morto politicamente por colocar, quando no segundo mandato de prefeito de Nova York, sob permanente suspeita de autoria de crimes, negros e latino-americanos e por encetar perseguições cotidianas, com prisões de bebedores de cerveja apanhados ou por embriaguez ou por terem urinado nas ruas.

A war on drugs de Alckmin ataca no varejo, ou seja, mira no ilícito de menor potencial ofensivo, sujeito a juizados de pequenas causas criminais. O último solar exemplo acaba de acontecer com a detenção de três universitários que consumiam, para fins lúdicos recreativos (não medicinal), maconha do campus da USP. A polícia não reprime os grandes traficantes e adere ao truísmo bushiano-religioso de que sem consumo não haveria oferta. Assim, sai atrás dos maconheiros, e não dos traficantes. Um dos maiores traficantes do planeta, Juan Carlos Abadia, fixou residência e operou durante anos em São Paulo, sem ser molestado pela polícia paulista.

Após a consumação por pessoas estranhas ao campus da USP de crimes graves, celebrou-se um acordo, pelo prazo de cinco anos, voltado “a reforçar a proteção” à população do campus da USP. Esse acordo foi firmado pelo comando da PM e por Grandino Rodas, aquele que não encabeçava a lista de selecionados para o múnus de reitor, mas acabou escolhido pelo então governador José Serra, apesar das inúmeras trapalhadas à frente da Faculdade de Direito.

À época o acordo contou com a aprovação da maioria dos universitários, ainda sob comoção decorrente do latrocínio (matar para roubar) do estudante Felipe Ramos de Paiva, de 24 anos. Hoje, e sabedores da política de segurança do governo Alckmin, os universitários e os trabalhadores do campus desejam a revisão do tal acordo e cogitam uma greve geral.

Com a detenção dos três estudantes surpreendidos a fumar maconha em estacionamento para automóveis, houve reação desproporcional, radical, por parte dos colegas dos detidos. O exagero daqueles que se sentiram ameaçados por policiais num território tradicionalmente livre de ideais libertários. Outro caminho deveria ter sido trilhado pelos universitários que estão legitimados a postular a revisão do acordo com a PM e a exigir segurança por meio de um adequado corpo de funcionários da própria USP, ainda que Grandino Rodas prefira a PM.

Do confronto entre estudantes e policiais, chegou-se à ocupação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras, à migração, por uma minoria enfurecida e derrotada em assembleia, para o prédio da reitoria e a reintegração coercitiva da posse. Aí, a Polícia Civil Judiciária perpetrou a ilegalidade de enquadrar os universitários como criminosos organizados em quadrilha e bando.

Uma PM despreparada para tratar com universitários foi a causa imediata de tamanho tumulto. Em agosto de 2007, a mesma PM invadiu a Faculdade de Direito da USP e isso levou o saudoso professor Goffredo da Silva Telles a elaborar e anunciar a famosa Carta aos Brasileiros, onde advertiu sobre os resquícios autoritários e proclamou o Território Livre.

A causa do desacerto no campus, frise-se, decorre da política eleita por Alckmin, num tempo em que o direito penal se humaniza. Até para crimes graves usam-se institutos que isentam de processos, condenações ou penas: plea bargaining, pattegiamento, delação premiada, desassociação, bagatela-insignificância. Além disso, ensina a máxima romana que “de minimis non curat praetor”.

Pano Rápido: “Todos os estudantes foram conduzidos à delegacia, sem que fosse necessário nem um disparo”, vangloriou-se o secretário da Segurança. Pelo que disse, disparos de arma de fogo tinham sido previstos. Só faltou o grito do anauê integralista.

USP: muito além da repressão

Por Antonio Martins

Os ocupantes da reitoria da USP eram muito poucos: 73. Não esboçaram o menor gesto de resistência, segundo a própria coronel Maria Yamamoto, chefe de Comunicação Social da Polícia Militar. Mesmo assim, a PM ostentou truculência. Arrombou-se a reitoria. Antes disso, a residência universitária (o legendário CRUSP, ocupado pelo exército em 1968) foi cercada e atacada com bombas de gás lacrimogêneo.

Todos os estudantes foram presos e humilhados. Primeiro, a polícia separou homens de mulheres, em salas escuras da própria reitoria. Nesse momento, segundo alguns relatos, ouvia-se “barulho de estilhaços”, como se a PM, que já dominara o prédio, se empenhasse em produzir cenas de vandalismo.

Mais tarde, os 73 foram confinados por várias horas, sob calor, e ameaçados de enquadramento em crimes graves. Circularam boatos de que só seriam libertados (provisoriamente) após o pagamento de fianças pesadas — restando, aos que não as saldassem, os presídios.

Nada disso era necessário, se o interesse da operação fosse apenas reintegrar a posse da reitoria ao autoritário João Rodas, que a comanda. E o governador Geraldo Alckmin estava informado de tudo à tarde, quando afirmou, em entrevista: “os estudantes precisavam de uma aula de democracia”.

A simbologia está completa — e assusta. A polícia reproduziu ao máximo as operações que o aparato repressivo desencadeava contra revoltas estudantis, durantes os governos militares. O governador usa a mesma palavra-chave: a ditadura alegava agir no interesse da democracia para derrubar um governo legítimo, assumir o poder e restringir as liberdades.

Que pretende o governador Alckmin? Em todos os momentos de incerteza, há tanto a esperança de transformação quanto o risco dos retrocessos. Sempre que a ordem vigente se fragiliza, os setores mais inseguros e conservadores da sociedade buscam refúgio no autoritarismo. Querem encontrar no cassetete algo que os proteja da liberdade e suas incertezas. Regimes como os comandados por Hitler, Mussolini e Franco; ditaduras com as que marcaram a América Latina nos anos 1960 e 70 surgiram a partir da mobilização dos que temem o novo.

Em São Paulo, estes setores podem ser articulados como em nenhum outro estado. Aqui, o PSDB reina há 17 anos — com a cumplicidade de uma mídia que abafa seguidas denúncias de corrupção e, mais importante, esconde a decadência econômica de um Estado que gostava de se chamar “a locomotiva do país”. Aqui, há uma oligarquia poderosa, que sofre a perda dos privilégios e se ressente com o avanço das periferias e dos nordestinos. Aqui, esta camada sente-se chocada com movimentos novos, que combinam a crítica ao capitalismo, alianças entre excluídos e classe média (evidente nos saraus da periferia ou nas ocupações dos sem-teto), questionamento da família e valores tradicionais (em nenhuma outra cidade brasileira, há uma parada gay como a de São Paulo, ou uma rua como a Augusta). Daqui, podem surgir tanto um novo projeto de Brasil quanto o encanto retrô com o país aristocrático.

Nas eleições presidenciais do ano passado, José Serra tentou mobilizar o ultraconservadorismo paulista. Geraldo Alckmin opõe-se ao então candidato tucano, nas disputas internas do PSDB, mas parece interessado em herdar este capital político. A brutalidade da desocupação da reitoria é um sinal de alerta.

Que remete, aliás, a outros debates. Estamos todos contra a PM. Mas é preciso discutir melhor a ação de pequenos grupos vanguardistas, que se aferram à ideia de revolução dos séculos passados e tentam privatizar, em favor de seus partidos, o sentimento libertário da multidão. É assunto para outros textos.

Escândalo na USP aperta cerco ao reitor polêmico

Artigo original

O Ministério Púbico de São Paulo abriu mega-investigação contra a Reitoria da USP, acusada de eventual “violação aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, burla ao acesso de cargo mediante concurso público, lesão aos cofres públicos e improbidade administrativa”. O principal investigado é o advogado João Grandino Rodas, atual reitor da USP, e um dos braços-direitos de Geraldo Alckmin e José Serra. A investigação é tocada pelo promotor de Justiça Valter Foleto Santin, da Promotoria do Patrimônio Público e Social do Ministério Público Estadual. O caso, mantido em sigilo, leva o registro de “Inquérito Civil 088/2011”.

João Grandino Rodas, que antes de ser reitor era diretor da Faculdade de Direito do Largo S. Francisco, a mais tradicional do país, é acusado de ter nomeado, como procuradores da USP um seu assessor político e o filho da reitora anterior, Suely Vilela –colocada como reitora a mando de José Serra. A dupla ocupa os cargos sem terem prestado concurso e em desacordo com o estatuto da maior universidade do país.

O inquérito civil instaurado pelo promotor Valter Foleto Santin atende a uma denúncia anônima. O principal foco, segundo o promotor, é “apurar nomeações, feitas pelo reitor Grandino Rodas, dos servidores Gustavo Ferraz de Campos Monaco e Carlos Alberto Vilela Sampaio, como Procuradores da USP, sem concurso púbico e sem o preenchimento de requisito de cinco anos de efetivo exercício de advocacia, além de eventual nomeação irregular para cargo de confiança do Procurador-Chefe da USP”.

Contra Rodas, o Ministério Público salienta que ainda investiga “criação de cargos de Pró-Reitor Adjunto, sem previsão orçamentária e sem autorização legal, designações indevidas para os cargos criados, acumulações ilegais de funções de Diretor de Unidade e de Vice-Reitor para exercício em cidades distintas e longínquas”.

O Ministério Público alega que as nomeações do assessor político de Rodas e do filho da ex-reitora da USP teriam violado o princípio constitucional da impessoalidade, vez que Gustavo Ferraz de Campos Monaco seria apadrinhado político de Rodas e Carlos Alberto Vilela Sampaio circule na USP ostensivamente se apresentando como filho da ex-reitora.

João Grandino Rodas

O caso só veio a público porque em 10 de agosto passado a Associação dos Docentes da USP, a Adusp, recebeu comunicado do promotor que apura as denúncias, em que pede informações sobre o caso. O caso só chega a público em decorrência da publicidade dada pela Adusp.

Os dois investigados já remeteram à promotoria suas versões para tentar sustar as acusações. Gustavo Ferraz de Campos Monaco alega que é “indubitável” que ele disponha de mais de cinco anos de advocacia, como bacharel de direito em “funções privativas”. Ele anexou em sua defesa seu Currículum Lattes, exigido a todos os funcionários as USP. Confira.

Monaco também alega em sua defesa que seu cargo na USP se justifica porque “ em toda a administração pública existem alguns caros de Procurador de livre provimento, para funções de chefia, direção e assessoramento”.

Já Carlos Alberto Vilela Sampaio, filho da reitora que antecedeu João Grandino Rodas, cita em sua defesa a Súmula Vinculante 13, do Supremo Tribunal Federal, alegando que não é “parente consangüíneo nem por afinidade da autoridade nomeante (reitor), e tampouco é de servidor que exerça cargo de direção, chefia ou assessoramento, posto que a professora Suely Vilela (cujo exercício como reitora foi entre 2005e 2009) não exerça nenhum cargo de direção, chefia ou assessoramento desde o final de seu mandato reitoral até a presente data”. Em desacordo à recomendação dada pela USP a seus funcionários, Carlos Alberto Vilela Sampaio não dispõe de curriculum na Plataforma Lattes.