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O que ninguém sabe ou o que ninguém quer saber – USP

Por Luiza Fonseca de Souza

Os estudantes que ocuparam a reitoria da USP passaram da conta? Sim. Eles decidiram a ocupação numa votação manipulada, que já foi explicado neste blog, que inclusive contém a carta dos estudantes contra a ocupação ilegítima, mas 400 policiais com helicóptero, cavalaria, choque e GOE pra retirá-los dali? Faça-me o favor. “Polícia para quem precisa”. E a entrada no Condomínio Residencial da USP, o CRUSP, com direito a agressão aos moradores, que acordaram em meio a confusão?!

Mas o pior de tudo, é que já era esperado de um reitor com um histórico como o de João Grandino Rodas. Depois as pessoas se perguntam porque alguns coquetéis molotovs foram achados na reitoria. Se ninguém os protege, eles mesmos tem que fazer.

“O que ninguém diz: João Grandino Rodas, investigado por corrupção pelo Ministério Público, entrou para a História por ser o primeiro reitor escolhido pelo governador (Serra) à revelia dos fóruns da USP desde Paulo Maluf na Ditadura. Rodas, que estava ao lado da ditadura (no caso Zuzu Angel e outros casos), foi o primeiro reitor a autorizar a ocupação militar da USP desde a redemocratização do país. Isso sem falar que o Estatuto da USP é da década de 70 e não foi reformulado depois da Constituição Cidadã.”

Após esse pequeno e sucinto, porém significativo, texto veiculado no Facebook por amigos da autora, Mari Sucupira, assistam esse vídeo e confiram a truculência da Polícia Militar contra o estudante e morador do CRUSP pedindo e tentando entrar no seu apartamento. Muito triste uma instituição que deveria proteger o cidadão impedindo-o de entrar em sua moradia. E mais ainda a sociedade aplaudindo todo esse caos.

USP: Um Desabafo

Por Igor Machado de Azevedo Bossonaro

Aviso: Esse artigo possui 6 páginas. Se você achar longo demais não se preocupe, certamente a VEJA ou a GLOBO poderão te dar um resuminho que você será capaz de processar em 3 minutinhos, antes de assistir o Big Brother. Obrigado por nos visitar.

“Cinco da manhã. Você mora no CRUSP, mas não é afiliado a partido nenhum. Sempre foi apenas estudar, diz que se sente orgulhoso pela coroação do seu próprio esforço em conseguir passar na USP, e por isso mesmo sempre foi contra qualquer paralização – a Universidade é para estudar, não é para discutir política. Você estuda Literatura, então te interessa discutir o texto crítico que fala da obra literária que fala de política. Essa é sua carreira. Então começa a respirar mal, dormindo, porque tem gás lacrimogênio entrando pela sua janela. Tenta sair, mas tem luz de helicoptero na sua cara. Ouve bala de borracha de madrugada, e criança chorando, vê de relance cavalos e fuzis de verdade, gente algemada, gente gritando. Chega mais perto no meio da fumaça, para ver o que é. Sente a força nas costas, cai no chão. É algemado. Entenderam tudo errado. Você não queria ajudar ninguém…”
-Yuri Bossonaro.

Esse artigo tem como objetivo lançar uma luz sobre os eventos lamentáveis do dia 08/11, ultima terça, quando a ocupação da reitoria na USP se tornou uma zona de guerra com mais de 400 policiais da tropa de choque, 3 helicópteros, policia montada, fuzis, gás lacrimogêneo e bala de borracha. 72 estudantes e funcionários da USP foram detidos. Dezenas de outros, como o coitado do texto acima, apanharam por estar no lugar errado na hora errada.
A despeito de minha raiva instantânea por tudo o que aconteceu, o pior veio depois, ao me deparar com a hedionda complacência e quase admiração com que amigos, familiares e tantos outros aplaudiram as ações da PM, como se estivéssemos falando da ocupação de um morro tomado por traficantes e não da invasão de uma reitoria repleta de alunos, estudantes…
Talvez isso se deva ao fato de que grande parte dessas pessoas não tenha a menor idéia de quem seja João Grandino Rodas, o reitor da USP e responsável pelo “massacre” da ultima terça, e também não tenha a menor idéia do que os alunos realmente reivindicavam. Prefiro tentar manter algum otimismo ou esperança na minha espécie.
Decidi perfurar o “lobby” da grande midia uma vez mais e fornecer algumas informações. O que cada um fará com elas, ou se elas serão capazes de mudar a cabeça de alguém, ja nao posso dizer. Só não posso me calar.
Antes de falar sobre o ocorrido da ultima terça, acho interessante um breve esclarecimento sobre os 3 principais elementos da tragédia: Os estudantes da FFLCH, João Grandino Rodas e a Policia Militar Brasileira.

Sobre os estudantes:
Segundo ranking internacional feito pela Top Universities, nove cursos da USP figuram entre os 200 melhores do mundo. Dentre esses, seis são da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas: Filosofia, Sociologia, História, Lingüística, Ciências Políticas e Geografia.

Posto que esse índice mede o resultado do aprendizado do aluno, é interessante citá-lo para mostrar como aqueles barbudos subversivos que nossa mídia marrom tem pintado como um “bando de baderneiros sem causa” são na verdade as maiores mentes de nosso país, pelo menos sob o aspecto acadêmico.
Pode-se alegar que os responsáveis pela ocupação na reitoria não representam a vontade de todos os alunos da FFLCH, isso é fato. Mas se existem divergências quanto aos meios adotados pelos ocupantes e os demais alunos, o mesmo não se aplica aos fins. Que fins são esses? Voltaremos nisso em breve.

Sobre João Grandino Rodas:
Reitor da USP, colocado lá por José Serra em 2009, Grandino Rodas participa do corpo docente da universidade a muito mais tempo, possuindo um histórico bastante questionável de relacionamento com militares durante o período da ditadura. Possui um processo investigativo de desvio/uso indevido de milhões de verba publica na universidade.
Rodas também está sendo investigado pelo Ministério Público de São Paulo por corrupção pelo envolvimento em escândalos como nomeação a cargos públicos sem concurso (inclusive do filho de Suely Vilela, reitora anterior a Rodas), criação de cargos de Pró-Reitor Adjunto sem previsão orçamentária e autorização legal, e outros.
É considerado o reitor mais ausente da história da universidade, jamais se colocando a disposição tanto dos alunos quanto do próprio corpo docente, sendo inclusive o primeiro reitor da história a ser considerado “persona non grata” pela Congregação da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em represália a constantes ataques contra seu atual diretor.
Desde muito antes dos recentes episódios que colocaram em cheque a segurança da universidade, como o assassinato do aluno no estacionamento, já possui um histórico extremamente próximo com a Policia Militar. Em 22 de agosto de 2007, na época diretor da Faculdade de Direito, foi responsável pela entrada da tropa de choque na Faculdade, expulsando manifestantes da UNE e do MST, estudantes e membros do diretório acadêmico que haviam ocupado o prédio como parte das manifestações da Jornada da Defesa da Educação.
Em janeiro de 2011 foi responsável pela demissão em massa de 270 funcionários, por corte de verbas – a despeito dos imensos desvios e má aplicação do orçamento. Esse fato e diversas outras denuncias lhe renderam um convite para prestar esclarecimentos na Assembléia Legislativa de São Paulo (24 de março de 2011), mas ele não compareceu. Ele também não compareceu a dezenas de outras reivindicações e assembléias convocadas pelos alunos e professores ao longo de seu mandato. O que se fala é que é mais eficiente reclamar para Deus do que para João Grandino Rodas, no que concerne qualquer problema, duvida ou questionamento a respeito do que se passa na USP.

Sobre a Polícia Militar
Considerada uma das policias mais violentas do mundo, é um órgão que durante as décadas de ditadura foi usado como maquina de repressão do estado sobre a população. Foi NO MÍNIMO indiretamente responsável ou NO MÍNIMO complascente com o desaparecimento e assassinato de pelo menos 475 pessoas, segundo o livro “Direito a memória e à verdade”, publicado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos na ultima década.
Durante o período da ditadura a Policia Militar e a USP tiveram um relacionamento particularmente tenso, já que os principais movimentos de combate à ditadura no Brasil nasceram na universidade. Uma parcela considerável de nossos desaparecidos políticos daquele período eram alunos ou professores.
É uma policia subordinada aos governos dos estados e não às prefeituras, um modelo bastante raro no mundo. É apenas uma das muitas alternativas para assegurar a segurança pública, como a Policia Civil ou a Guarda Civil da USP, que deixou de receber treinamento e investimento por decisão do próprio Grandino.
Protagonizaram diversos eventos recentes de abuso de violência e repressão a artistas de rua, passeatas pacíficas ou movimentos como o Acampa Sampa.
O então delegado da Policia Militar (e hoje deputado estadual) Hélio Luz deu um chocante depoimento no documentário “Noticias de uma Guerra Particular” onde ele é bem categórico em dizer que “a polícia faz o papel de ‘proteção da elite’ e só pode usar a repressão para controlar dois milhões de pessoas nas favelas”. Ele admite que a polícia é uma instituição corrupta e afirma que “nós garantimos uma sociedade injusta”.

Apresentados os personagens da tragédia, vamos aos fatos.
A despeito da crença popular de que o fato que desencadeou na invasão da reitoria e subseqüente violência da ultima terça tenha sido a prisão de 3 estudantes por estar fumando maconha no campus, os problemas do movimento estudantil que resultaram na ocupação da reitoria datam de muito antes.
A USP carece de planejamento urbanístico que favoreça a segurança, carece de iluminação apropriada e desde que Grandino Rodas assumiu a Guarda Universitária – real responsável pela segurança da autarquia (significa pela constituição que possui direito à autonomia administrativa) que é a USP – tem sofrido constantes cortes orçamentários, cortes em treinamento, equipamento, etc.
Isso já é pauta de discussão entre os diversos membros do movimento estudantil faz anos. Grandino Rodas não apenas ignorou durante anos os apelos do movimento, como adotou algumas outras medidas “excelentes” para a segurança da faculdade, como proibir a circulação de não-alunos nas dependências da Universidade.
Obviamente essa proibição vale apenas para as pessoas que como eu ou você, usam a portaria da USP, mas não para os trombadinhas ou traficantes que pulam os muros ou se embrenham pelas matas que cercam o campus. A USP já era um local ermo, se tornou um lugar ainda mais vazio. Sem iluminação e sem investimento algum em segurança, se tornou realmente terra de ninguém.
O que poucos enxergam é que isso foi deliberadamente provocado por Rodas ao longo de anos, sob constantes protestos e reclamações do corpo estudantil, para criar uma situação que JUSTIFICASSE a presença da PM na universidade.
As reivindicações dos alunos que invadiram a reitoria e foram arrancados de lá na porrada essa semana não eram “poder fumar maconha no campus”. O que eles queriam era o que já estavam pedindo a anos: Investimento real na segurança da Universidade, mas não abrindo as portas para a PM e fechando para a população (o que Rodas fez).
Grande parte do movimento estudantil da USP era contrário à ocupação do prédio da reitoria, mas são TOTALMENTE solidários às reivindicações listadas acima. Prova disso é a adesão de mais de 3000 alunos na assembléia realizada no dia 08/11, onde se decidiu pela greve.
Todas as decisões de Rodas nos últimos anos confluem para um único fim: Coibir a autonomia administrativa da universidade. Implodir sua estrutura de forma a justificar uma presença cada vez mais constante do estado, um movimento para a privatização das universidades e sua subseqüente subordinação ao segundo setor.

A palavra “Democracia” é derivada do grego “demo” (povo) e “cracia” (poder ou governo). Em um mundo onde nossa “democracia” tem se tornado uma ditadura subliminar, em que o estado se coloca sobre o povo e as empresas e corporações se colocam sobre o estado, a USP (berço intelectual, historicamente responsável pelo nascimento da maioria das revoluções que nosso país conheceu) possuir autonomia administrativa é uma imensa ameaça e um incomodo a ser extirpado.
E usando os bons e velhos artifícios de MEDO para convencer a população de que é preferível abrir mão da própria liberdade para ter segurança (11/09 e o ato patriótico nos EUA, só pra dar um exemplo bem recente) os grandes veículos de mídia, subordinados ao estado e às grandes empresas, estão conseguindo virar a opinião pública contra aqueles que lutam pela nossa liberdade.

Agora está feito. Você pode ter lido (talvez pela primeira vez) os motivos REAIS da ocupação no prédio da reitoria, pode ter ouvido um outro ponto de vista, e continuar achando tudo isso sem significado, continuar achando a causa vazia. Tudo bem.
Não acho que toda a população precise concordar com os motivos de um protesto ou de outro. Como me disseram ontem e eu concordo, “democracia também é divergência de opiniões”. A única coisa que espero da população é que não concorde com a violência que rolou. O cassetete que usaram é um só, pra bater na cabeça deles ontem e na minha (e na sua) amanhã.
Há um direito que antecede o direito codificado, o direito natural. Um código inerente à humanidade presente em todo ser humano, que faz a morte ser crime em quase todo canto, ou acende a luz dentro da maioria, criando desconforto ao saber do apenamento com a morte. Estrahamente esse mesmo código não indica à maioria que, NUNCA, meninos ou homens podem ser espancados, mesmo após condenação. Simplesmente não consigo entender o sangue nos olhos, quase em júbilo, com que algumas pessoas defenderam a violencia que foi perpretada na USP ontem. Me faz me perguntar se estamos perdendo nossa humanidade. Nós evoluimos alguma coisa desde que ficavamos em arquibancadas do coliseu babando enquanto gladiadores eram decapitados ?
Sei que toda generalização é burra, que não existe apenas um tipo A e um tipo B de pessoa, e também não gosto de ficar citando rede social de internet em meus textos, acaba zicando um pouco o ar de “atemporalidade” que eu gosto de dar para eles. Mas é impressionante como todas as pessoas que ontem de manha, no Facebook, estavam defendendo a invasão violenta da PM na reitoria, que estavam chamando os estudantes de “maconheiros sem causa”, de noite já estavam falando sobre a novela, o jogo de futebol, postando foto do brigadeiro que fizeram no microondas. E aqueles que se horrorizaram com o que aconteceu, que replicaram os manifestos dos estudantes, as fotos da violencia, de noite continuavam trocando textos, informações, se indignando. E hoje continuaram fazendo o mesmo…
E esse primeiro “tipo A” hipotético (a do futebol ou da novela) também é o mesmo tipo de pessoa que costumava usar os jargões “Dilma terrorista” ou “Bolsa-Esmola”, entre outros. É nosso brasileiro burguês médio, que só gosta de discutir politica na medida necessária para não fazer feio nas conversas de escritório, mas no fundo não está realmente interessado em nada e prefere viver como escravo – fingindo que é livre por poder trocar o Iphone todo ano – do que enxergar a verdade desconfortável.
É o cara que se tivesse vivido em 70 e poucos no Brasil, chamaria o guerrilheiro que lutava contra a ditadura de “ladrão” ou “terrorista”, e que acharia que é OK um estudante ou professor sumir ou tomar um tiro numa ruela por aí, afinal eles estavam “pedindo por isso mesmo”.
Todo mundo quer que as coisas fiquem bem, sem ter que limpar a sujeira depois. É patético o argumento de que “nao queremos pagar a conta” de meia de duzia de móveis quebrados na reitoria, enquanto Rodas esta sendo investigado por desvios de MILHÕES ! A desinformação do povo me dói o estomago …..
Como diria o ditado popular, “as vezes é necessário quebrar alguns ovos para fazer uma omelete”. Mas o burgues brasileiro médio é do tipo que come em restaurantes, ele nao sabe quebrar ovos nem fazer omelete.
Uma vez mais, cabe aos “barbudos que moram de aluguel” oferecer a outra face (e infelizmente as vezes uma cadeira ou um tomate) para o cassetete e o escudo da tropa de choque, na luta para construir as mudanças das quais um dia todos esperamos usufruir …
Mais de 3 mil estudantes se reuniram, em greve, não só os “barbudos maconheiros inuteis” mas também seus futuros advogados e médicos, dispostos a discutir o que aconteceu e por um fim no terror que se instituiu na USP. Mas todos eles devem ser mesmo apenas um bando de desocupados lutando por seu direito de fumar maconha livremente e estar acima da lei …

Encerro meu texto com um pedido simples e direto: Ninguém é obrigado a ter uma opinião sobre esse assunto (ainda que eu ache estranho que isso nao ocorra naturalmente). Ninguém é obrigado a concordar com isso tudo, aliás falei com muita gente razoável e inteligente que continua sendo contra a ocupação e não tenho problema algum com isso. Ninguém é obrigado a ter uma causa, em primeiro lugar. Conheço pessoas incríveis que preferem fazer milhares de coisas em vez de se aborrecer com política e respeito isso totalmente. São as pessoas tipo C, D, E, F, G, etc desse mundo. Diversidade é essencial em qualquer sociedade saudável.
Mas, às pessoas que ficaram lotando meu facebook, caixa de e-mail ou meus ouvidos mesmo, com argumentos parcos sobre “maconheiros vagabundos” e sobre como a policia “tem mais é que descer o cacete”. A essas pessoas eu mando um recado.
Todo mundo que quiser opinar sobre o assunto com essa intensidade – nem que seja para condenar os estudantes e defender Rodas e a PM – tem que se informar o mínimo primeiro.
Toda discordância, todo questionamento, será benvindo e acrescenta na discussão. Isso é democracia. Mas falar sem pensar não acrescenta. É só produzir barulho.
Melhor voltar pro Big Brother.
Se não for ajudar, pelo menos não atrapalhe.

NOTA POSTERIOR À PUBLICAÇÃO DESSE ARTIGO – Hoje, dia 11/11, o Estado de São Paulo anunciou a decisão da PM em construir sua primeira unidade DENTRO da Universidade de São Paulo. Já existe planejamento de local, construção, já existe projeto feito.
Mais do que nunca sou levado a acreditar que a prisão dos 3 estudantes fumando maconha na outra semana foi um ato deliberado feito com o objetivo de criar revolta nos estudantes e atrair a atenção da midia, garantindo a manipulação da opinião publica.
A PM tem circulado pela USP faz semanas, e a despeito do consumo de maconha la dentro realmente ocorrer com certa liberdade, nunca ninguém foi preso. De repente, uma semana antes de anunciarem a criação dessa unidade dentro do Campus, a policia resolveu prender alguém. Coincidência ?
Acho que não … E infelizmente os estudantes morderam a isca…

USP: muito além da repressão

Por Antonio Martins

Os ocupantes da reitoria da USP eram muito poucos: 73. Não esboçaram o menor gesto de resistência, segundo a própria coronel Maria Yamamoto, chefe de Comunicação Social da Polícia Militar. Mesmo assim, a PM ostentou truculência. Arrombou-se a reitoria. Antes disso, a residência universitária (o legendário CRUSP, ocupado pelo exército em 1968) foi cercada e atacada com bombas de gás lacrimogêneo.

Todos os estudantes foram presos e humilhados. Primeiro, a polícia separou homens de mulheres, em salas escuras da própria reitoria. Nesse momento, segundo alguns relatos, ouvia-se “barulho de estilhaços”, como se a PM, que já dominara o prédio, se empenhasse em produzir cenas de vandalismo.

Mais tarde, os 73 foram confinados por várias horas, sob calor, e ameaçados de enquadramento em crimes graves. Circularam boatos de que só seriam libertados (provisoriamente) após o pagamento de fianças pesadas — restando, aos que não as saldassem, os presídios.

Nada disso era necessário, se o interesse da operação fosse apenas reintegrar a posse da reitoria ao autoritário João Rodas, que a comanda. E o governador Geraldo Alckmin estava informado de tudo à tarde, quando afirmou, em entrevista: “os estudantes precisavam de uma aula de democracia”.

A simbologia está completa — e assusta. A polícia reproduziu ao máximo as operações que o aparato repressivo desencadeava contra revoltas estudantis, durantes os governos militares. O governador usa a mesma palavra-chave: a ditadura alegava agir no interesse da democracia para derrubar um governo legítimo, assumir o poder e restringir as liberdades.

Que pretende o governador Alckmin? Em todos os momentos de incerteza, há tanto a esperança de transformação quanto o risco dos retrocessos. Sempre que a ordem vigente se fragiliza, os setores mais inseguros e conservadores da sociedade buscam refúgio no autoritarismo. Querem encontrar no cassetete algo que os proteja da liberdade e suas incertezas. Regimes como os comandados por Hitler, Mussolini e Franco; ditaduras com as que marcaram a América Latina nos anos 1960 e 70 surgiram a partir da mobilização dos que temem o novo.

Em São Paulo, estes setores podem ser articulados como em nenhum outro estado. Aqui, o PSDB reina há 17 anos — com a cumplicidade de uma mídia que abafa seguidas denúncias de corrupção e, mais importante, esconde a decadência econômica de um Estado que gostava de se chamar “a locomotiva do país”. Aqui, há uma oligarquia poderosa, que sofre a perda dos privilégios e se ressente com o avanço das periferias e dos nordestinos. Aqui, esta camada sente-se chocada com movimentos novos, que combinam a crítica ao capitalismo, alianças entre excluídos e classe média (evidente nos saraus da periferia ou nas ocupações dos sem-teto), questionamento da família e valores tradicionais (em nenhuma outra cidade brasileira, há uma parada gay como a de São Paulo, ou uma rua como a Augusta). Daqui, podem surgir tanto um novo projeto de Brasil quanto o encanto retrô com o país aristocrático.

Nas eleições presidenciais do ano passado, José Serra tentou mobilizar o ultraconservadorismo paulista. Geraldo Alckmin opõe-se ao então candidato tucano, nas disputas internas do PSDB, mas parece interessado em herdar este capital político. A brutalidade da desocupação da reitoria é um sinal de alerta.

Que remete, aliás, a outros debates. Estamos todos contra a PM. Mas é preciso discutir melhor a ação de pequenos grupos vanguardistas, que se aferram à ideia de revolução dos séculos passados e tentam privatizar, em favor de seus partidos, o sentimento libertário da multidão. É assunto para outros textos.

Nota do CAASO sobre a PM no campus

Em maio de 2011 um aluno foi assassinado dentro da USP. Um fato desses representa o máximo suportável da imensa falta de segurança dentro do campus de São Paulo. Assaltos e furtos ocorrem à luz do dia e a segurança universitária era insuficiente em efetivo, em equipamento e também em treinamento.

É nesse contexto onde o medo faz parte do cotidiano dos estudantes, que o atual reitor Rodas fez um acordo com a polícia para uma maior atuação da Polícia Militar dentro dos campi. No começo de 2011, a polícia militar começou a se instalar na USP e em setembro foi fechado o convênio. Muitos aplaudiram a medida, pois a guarda traria segurança numa hora de necessidade. Muito porém é necessária a reflexão quanto as atitudes tomadas pelo Rodas, pela PM e pelos estudantes.

Apesar da mídia publicar que a polícia estava cumprindo seu papel prendendo os estudantes por porte de drogas, sabemos que esse não é o real motivo pelo qual a PM atua no campus. É fato que houve uma diminuição da violência na Cidade Universitária, afinal a presença da PM é algo intimidador aos criminosos. No entanto, não podemos esquecer que a atuação desses PMs designados para a cidade universitária tem sua ação restrita ao próprio campus, e na mesma proporção que a criminalidade reduziu dentro destes muros, aumentou muito nas proximidades. Um exemplo disso é o que aconteceu com a estudante Camila Fernandes da Silva, 22, que foi assaltada e baleada ao sair da USP. Assim, portanto, devemos fazer o debate sobre segurança pública. Ao propor resoluções dos problemas referentes à violência, a única medida tomada pelo reitor após a morte do estudante da FEA foi permitir a entrada da PM na Universidade. Os reais problemas seguem sem solução: Ruas mal iluminadas, espaços vazios sem circulação, ausência da guarda do campus, enfim, todos os problemas gerados por um projeto urbanístico não superado. Até mesmo duas estações de metrô que foram planejadas para serem construídas dentro da cidade universitária foram vetadas pela reitoria; estações, estas, que aumentariam a circulação de pessoas dentro do campus, a segurança, a facilidade de acesso aos milhares de pessoas que por lá circulam, e que devido a estas medidas devem andar por mais de um quilômetro para ir da estação Butantã de metrô até a USP.

A polícia militar está presente nos campi, sobretudo em São Paulo, para reprimir qualquer tipo de movimentação estudantil. Ela está munida de armas, enquanto os alunos não. Da mesma maneira que em 2009, estudantes desarmados em passeata pacífica foram baleados com borracha e bombas de efeito moral, agora a história se repete uma vez mais.

Não poderíamos ver desfecho diferente: a ação exagerada de ocupar a reitoria e a resposta violenta e descabida, autoritária tanto do reitor quanto dos policiais contra os alunos mostra a extrema ausência de diálogo que reina na USP. O uso de 400 policiais, cavalaria, tropa de choque, sitiamento, recursos extremamente violentos contra 72 estudantes dentre os quais 24 eram garotas mostram como a PM é utilizada como braço de força do reitor, e consequentemente, como extensão do governo do estado que escolheu a dedo um reitor que foi o responsável pela primeira ação da polícia militar dentro da USP desde a ditadura militar.

Não podemos aceitar a criminalização de nenhum estudante, professor ou funcionário da USP ou de qualquer outra entidade de ensino por mobilizações de cunho social e político, por expressarem suas injurias contra a administração do ambiente em que vivem pelos motivos apresentados pela reitoria e polícia militar.

Portanto a Gestão Maior se posiciona contra o modelo de policiamento militar apresentado pelo reitor Rodas. Além disso, também se posiciona contra o modelo anterior no qual a insegurança e o medo eram constantes. Exigimos maior segurança por meio de soluções já sugeridas nesta nota e também na de outros CAs. Também apoiamos a renúncia do reitor João Grandino Rodas, uma vez que suas ações explicitam má administração da universidade além de posições políticas que não nos representam.